Lembro-me que quando conheci o Studio Ghibli, eu decidi que queria assistir todos os filmes que já tinham sido lançados pelo estúdio. Na época, eu já tinha assistido A Viagem de Chihiro, O Reino dos Gatos, O Castelo Animado, e todos eles tinham uma mensagem em comum – e final feliz, que eu não dispenso.
Então ouvi falar de Hotaru no Haka, ou como nós chamamos aqui, Túmulo dos Vagalumes. O filme não é dirigido por Hayao Miyazaki, e sim, uma criação de Isao Takahata, conhecido por gostar de mostrar em seus filmes, o dia-a-dia das pessoas comuns. Então, eu baixei o filme e fui assistir, sem ler nenhuma sinopse para saber do que se tratava.
Começando pela história, todos nós algum dia estudamos a Segunda Guerra Mundial. Aprendemos que havia dois lados, os “bons” e os “maus”. E no lado dos maus, falava-se em Itália, Alemanha e Japão. Alemanha tinha Hitler, o exterminador de Judeus, a Itália tinha Mussolini, e o Japão tinha um Imperador e muitos kamikazes. A justificativa para Hitler era proteger a raça ariana, pura, e aprendemos também que os seus aliados pensavam da mesma forma. E aí, vemos toda a história contada em filmes épicos, como Pearl Harbor, que conta a história da batalha entre uma fortaleza americana e os kamikazes japoneses, onde as vítimas, obviamente, são os americanos. Mas, e o outro lado?
Bem diz um ditado que a história é contada pelo lado vencedor, e isso é muito verdade. Quando os professores falavam dos kamikazes, eu acreditava piamente que eram malucos, se matando a troco de nada – honra? Não temos a cultura aqui de morrer por honra. E os muçulmanos que se explodem por aí, serão seus ideais tão diferentes assim dos kamikazes?
E aí me deparei com a história de Túmulo dos Vagalumes. Duas crianças, o pai é um soldado na Guerra, e eles só tem a mãe, até que durante um bombardeio, a mãe morre, e eles vão morar com alguns parentes. Mas a situação vai ficando cada vez mais crítica, a medida que a Guerra consome os homens. Na situação de Guerra, um país chega a parar toda a sua produção, e a conseqüência óbvia é que logo começam a faltar itens básicos de sobrevivência, como alimentos e água. E é isso que acontece o filme. A família dos parentes começa a passar necessidades, e os dois irmãos são obrigados a vender bens para colaborar. Mas quando os bens acabam, a família dos parentes chega a conclusão que precisa diminuir bocas para alimentar, e as duas crianças são convidadas a se retirar.
Eles não tem notícias do pai, que está na Guerra. Não sabem o que fazer, e passam a viver na rua, onde todo tipo de atrocidade acontece a eles. É nessa hora que nos perguntamos como fomos tão cegos. Não existe um lado certo em uma guerra! Todos perdem muito, são vidas perdidas, famílias destruídas, correntes quebradas.
Hoje, considero a maior atrocidade humana o lançamento das duas bombas atômicas sobre o Japão. Quando elas foram lançadas, o Japão já estava completamente destruído, só não haviam – ainda – declarado a rendição. As bombas foram a afirmação principalmente da supremacia americana, diante de um mundo devastado pela Guerra.
Acho a história de Túmulo dos Vagalumes uma das maiores lições que já tive em minha vida. Assistir é como levar um tapa na cara, sem ter como consertar o passado, mas com a certeza de que o futuro pode ser outro.
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Monolice
Formada em Ciência da Computação, conheceu o estúdio através de A Viagem de Chihiro e foi onde tudo começou pra ela. Seu filme favorito é Princesa Mononoke. Sua contribuição iniciou desde a época da comunidade da Ghibli no orkut, sendo atualmente membro honorário da Ghibli Brasil.
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Esse filme é dos mais tocantes q vi. Junto com Dolls, q é dos meus preferidos. Com certeza há aquele sentimento de culpa, principalmente por notarmos q as vezes, no nosso dia-a-dia, não somos tão bons com as pessoas nem nos dedicamos ao sentimento alheio por não querer atrapalhar nossa suposta felicidade com outras pessoas menos favorecidas, talvez. Uma lição de vida, de fato. Abraços
Assisti esse filme a uns anos atrás, e procurando o DVD para comprar acabei “caindo” nessa resenha.
Bem o filme é amargo, me senti muito mal após assistir pensando nas milhões de pessoas que sofreram dramas parecidos ao longo de toda a história da humanidade, numa guerra um lado sempre perde, o lado dos civis. E por favor, aquela menina me tirou lágrimas, eu nunca vi tamanho realismo de interpretação para um papel infantil, ela realmente parece uma criança mesmo, a dubladora e os animadores foram perfeitos!
Sobre a sua resenha, só não concordo com sua objeção aos ataques nucleares americanos, não que haja alguma coisa boa em uma bomba atômica, mas pense bem, o Japão ainda não estava rendido, estava sim se preparando para defender a ilha de uma invasão da URSS e dos EUA que ceifariam MILHÕES de vidas, de ambos os lados.
As forças armadas japonesas treinavam até mesmo crianças para resistir a invasão aliada, a guerra certamente se arrastaria por anos!
Hiroshima e Nagasaki foram uma atrocidade, mas como o próprio piloto do Enola Gay dissera à época, foi um golpe duro, que matou milhares para salvar milhões e abreviou o término do conflito, e acredite ou não, mas mesmo depois dos ataques americanos ainda não havia consenso entre os militares japoneses sobre uma rendição.