Chris Tex é um diretor e roteirista de filmes, séries e publicidade no Brasil. Já realizou trabalhos para a Warner, FOX, Omelete, além de ser o criador e diretor da websérie “Nerd of the Dead”. Seu trabalho mais recente foi o filme “A Placa de Rubi”, para o youtuber Whindersson Nunes. Agora, se dedica ao seu mais novo curta-metragem em tributo ao Studio Ghibli.
A Studio Ghibli Brasil entrevistou o cineasta Chris Tex, responsável pelo curta-metragem Wind Princess, que teve seu teaser lançado no início deste mês. Nós conversamos sobre sua carreira, desenvolvimento do filme e os desafios de uma produção independente. Você confere essas e outras informações abaixo.
Studio Ghibli Brasil: Conte um pouco sobre você, como surgiu seu interesse por cinema e como iniciou a carreira?
Chris Tex: Bom, a história é longa, mas tentarei resumir. Tudo começou quando vi meus vizinhos com uma câmera na mão tentando fazer o efeito de sabre de luz de Star Wars. Foi ali que eu descobri que era possível ter magia nesse mundo. Comprei uma câmera e comecei a fazer filmes caseiros com meus amigos de bairro. Mais pra frente, resolvi estudar cinema e apostar nos meus curtas. Entretanto, descobri que o mercado de exibição de curtas e de cinema no Brasil é muito restrito. Os filmes passam apenas em festivais pra poucas pessoas, onde os interessados são somente a galera da área. Foi então que resolvi apostar mais na internet e fazer conteúdo próprio para formar um público e tentar criar um cinema de gênero como Sci-fi, ação, aventura e terror.
SGB: Como conheceu o Studio Ghibli e os filmes de Hayao Miyazaki?
CT: O primeiro filme que eu vi foi A Viagem de Chihiro nos cinemas. Acredito que por conta do Oscar o filme chegou até às salas daqui. Fiquei chocado com esse filme por causa do traço, estilo de animação, linguagem e tudo mais. Na época eu já era fã de animes (por conta da TV Manchete), mas nunca tinha visto algo daquele estilo. Comecei a pesquisar sobre a carreira do Miyazaki e ver boa parte da filmografia do Studio Ghibli. Confesso que até hoje o meu favorito é Princesa Mononoke.
SGB: De toda a filmografia do diretor, o que te levou a escolher Nausicaä para o projeto? Acredita ser este um filme emblemático na carreira de Miyazaki?
CT: Existem vários motivos para eu ter escolhido a obra Nausicaä do Vale do Vento. O primeiro deles é que ela é uma obra Sci-fi e eu estava buscando isso. Eu queria contar uma história pós-apocalíptica, mas que possuísse uma mensagem de conscientização ecológica. O segundo é que ela possui um universo muito rico e é muito pouco explorado no sentido de live action. Já vi vários fan films de Princesa Mononoke, Viagem de Chihiro, Totoro, mas quase nada da Nausicaä. Outra razão é que, assim como a obra Akira (Katsuhiro Otomo), o próprio filme não consegue contar nem ¼ do mangá original. A história é muito mais extensa e épica e eu queria resgatar isso. E o último motivo é que, de fato, Nausicaä foi um marco na carreira do Miyazaki e foi antes do Studio Ghibli nascer. Acredito que ele deve ter um carinho especial por conta disso.
SGB: Sendo este um filme independente e com uma equipe pequena, quais os maiores desafios encontrados durante a produção?
CT: Vários! A falta de dinheiro é a maior delas (risos). Fomos até o sul do Brasil com uma equipe de 11 pessoas numa van cheia de equipamentos caros. A van quebrou várias vezes e o motorista nos abandonou no meio do percurso. Chegando lá, acontece a maior tempestade de areia da história da região. Entretanto, do amanhecer que começamos a filmar até o fim das filmagens, surgiu o sol mais lindo que já vi na minha vida e ele ficou lá exatamente para fazermos esse filme. No instante que eu dei meu último “corta”, o mundo desabou e uma nova tempestade surgiu. Os moradores locais foram muito parceiros com a gente e ajudaram na missão, emprestaram o jeep deles e transportavam a nave da Nausicaä no meio das dunas. Chegando em São Paulo tivemos muita dificuldade para encontrar um estúdio parceiro em que pudéssemos filmar em 360 graus um Chroma Key (pano verde). Também precisávamos de um pé direito alto para pendurarmos a personagem e fazer as cenas de ação em que ela voa. Existem muitos perrengues em fazer uma produção independente, pois além da falta de dinheiro, é necessário manter a chama da equipe acesa, porque todo mundo está dando o máximo sem ganhar algo em troca. Numa filmagem você pode ter certeza que sempre existirá stress e que merdas vão acontecer. É preciso ser um psicólogo.
SGB: Houve algum momento, perante as dificuldades, em que você pensou em abandonar o projeto? Ou isso nunca foi cogitado?
CT: Sim! Várias vezes. Até hoje eu me pergunto por que estou nessa. Mas toda vez que vejo um frame novo do filme sair do forno, a felicidade toma conta do espaço e meu cérebro diz: “Valeu a pena, cara!”.
SGB: Como se deu o procedimento na filmagem? Houve uma preocupação sua e da equipe em realizar uma adaptação fiel à animação original?
CT: Sim. Tentamos ser fiéis o máximo possível. Fizemos várias etapas e estudamos muito o recorte do filme que escolhemos trabalhar. Claro que, como toda adaptação pra outra linguagem ou um outro universo, ela sofrerá mudanças, mas o raciocínio sempre foi ser o mais fiel possível e ter um estilo e linguagem únicos.
SGB: Em relação ao planador, como surgiu essa ideia de criar uma réplica real da nave de Nausicaä do Vale do Vento?
CT: Como escolhemos basicamente a primeira cena do filme para recriarmos, existe um momento em que a Nausicaä tenta conter a raiva do Ohmu gigante. Pra fazer essa cena, foi necessário criarmos uma réplica real da nave e construir ela do zero. O pessoal da empresa Fixxon Realizações Criativas foi o responsável por conceber a nave nesse nosso mundo.
SGB: Houve uma comoção generalizada entre os fãs de Hayao Miyazaki. Nas redes sociais da Ghibli Brasil o pessoal ficou extremamente empolgado. Você esperava tamanha receptividade por parte do público?
CT: Olha, sinceramente, eu já lancei algumas coisas na vida, inclusive meu último trabalho foi um filme independente com o youtuber Whindersson Nunes, e meio que nunca dá pra saber o que vai acontecer. Lançar um filme no mundo é igual filho: Você não sabe se ele vai se tornar um dentista ou um médico, ou um político corrupto. Você só torce para que ele fique bem e que as pessoas o amem.
SGB: O teaser deixou os fãs do Studio Ghibli muito animados e, claro, muito ansiosos. O que podemos esperar depois desse lançamento?
CT: É como eu brinco: Do fundo do coração, o que eu desejo e o meu sonho é que esse filme atinja o máximo de pessoas possível, chegue até o Studio Ghibli e ao Miyazaki, ele assiste, pira e me convida para ir até o Japão. Eu o conheço pessoalmente, tiro uma selfie, entrego tudo que foi feito do filme pro Museu Ghibli, ele diz que vai nos ajudar a terminar o projeto e que irá fazer um lançamento exclusivo com o selo Ghibli. A realidade é que provavelmente eu irei tomar um processo (risos). Então assim, mesmo que nada disso aconteça, eu irei continuar fazendo esse projeto como dá. Trabalharei nas horas vagas das pós-produtoras e vou gastando dinheiro até finalizá-lo por completo. Quando estivermos satisfeitos, lançarei algo que ninguém jamais fez no Brasil.
SGB: No cinema existem casos onde curtas se tornaram longas. Futuramente, existe a possibilidade disso acontecer com Wind Princess?
CT: Com certeza. Isso só vai depender do próprio Miyazaki e do Studio Ghibli. Eles são os detentores dos direitos e só eles podem fazer isso. Se eles tiverem esse interesse e me chamarem pra dirigir… acho que zeraria a vida.
SGB: Quer deixar um recado para os fãs do Studio Ghibli no Brasil?
CT: Sim. Gostaria de falar para todos os fãs do Studio Ghibli e do grande Miyazaki me ajudarem nessa jornada. Eu acredito que esses fãs obcecados, assim como eu, são a chave para o sucesso desse filme. É o poder de vocês que irá fazer esse filme ter vida. Um filme só existe realmente quando ele é visto. Portanto, eu peço que vocês espalhem essa obra o máximo possível e, quem sabe assim, o pessoal do Japão descobre que existe uma conexão com os brasileiros muito maior do que eles imaginavam.
Se ainda não assistiu o teaser de Wind Princess, você pode conferir agora:
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Raphael
Jornalista por profissão e músico nas horas vagas. Aficionado por cultura japonesa desde pequeno. Atua como editor, revisor e social media da Ghibli Brasil.
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